Contribuintes ajuizaram 25 mil ações para excluir ICMS do PIS e da Cofins

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Dois anos depois do julgamento que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins, o Supremo Tribunal Federal (STF) ainda não analisou o recurso (embargos de declaração) apresentado no caso. Enquanto isso, cerca de 25 mil contribuintes pedem, na Justiça, a exclusão, segundo dados internos da área econômica do governo obtidos pelo Valor.

Apesar de reconhecer que a decisão já tem impactado a arrecadação desses tributos, os técnicos do governo não têm cálculos sobre o tamanho desse efeito. Até porque, explica uma fonte, ainda que estejam vencendo a disputa, alguns contribuintes fazem o recolhimento das parcelas questionadas por meio de depósitos judiciais, o que mantém o fluxo de receita do governo.
No recurso que está pendente de exame pelo Supremo, a Fazenda Nacional tenta, por meio de modulação dos efeitos, reduzir o prejuízo com o julgamento que, na pior hipótese, poderia chegar a R$ 250 bilhões. Somente depois da análise dos embargos o caso irá transitar em julgado, o que poderá levar a Fazenda Nacional a deixar de recorrer nos processos.

Mesmo sem o trânsito em julgado, a decisão já é aplicada por juízes, tribunais e até pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Foi utilizada como base para pedidos semelhantes envolvendo outros tributos, as chamadas “teses filhotes”. Há pelo menos 2,5 mil processos sobre o assunto que já transitaram em julgado, segundo a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN). Se a modulação do STF for favorável à União nos casos, eles poderão ser reabertos por meio de ações rescisórias.

Avaliações internas do governo apontam que, de um lado, a falta de julgamento dos embargos acaba preservando, ao menos parcialmente, sua arrecadação. Por outro, como a decisão ainda não pode ser considerada com trânsito em julgado, há a percepção de que gera insegurança jurídica, reduzindo investimentos.

“Imagina o empresário internacional que está planejando vir ao Brasil e o contador diz que não sabe exatamente quanto ele vai pagar de tributos porque ainda tem uma decisão sobre base de cálculo de uma contribuição importante para ser finalizada”, disse uma fonte, sem tomar posição sobre se seria melhor ou pior para o governo federal que os embargos fossem logo julgados.

Esse mesmo interlocutor avalia que, no mérito, a decisão do STF, na prática, vai invalidar a legislação do PIS e da Cofins, demandando que seja refeita. Nesse sentido, vale lembrar que, desde o governo anterior, já há uma proposta de reforma desses dois tributos.
Do ponto de vista técnico, a expectativa é que essa nova legislação, quando for enviada ao Congresso, já contemple a exclusão do ICMS da base de cálculo e também do ISS, tese que ainda não foi avaliada pelo STF, embora espere-se que, por analogia, decisão semelhante seja tomada.

Mesmo sem o julgamento dos embargos pelo STF, em outubro de 2018, foi publicada a Solução de Consulta Interna nº 13, da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), orientando como deve ser a devolução de valores nos casos que já transitaram em julgado.

A nota técnica, que considera as falas dos ministros do STF, aponta que a exclusão deve considerar o “ICMS a recolher” e não o total do tributo estadual apontado na nota fiscal do contribuinte. O ICMS a recolher é o que considera o desconto do que foi pago do mesmo tributo na fase anterior da cadeia produtiva, pois o sistema é de valor adicionado. A solução gerou novos questionamentos e embates entre contribuintes e a União.

O documento destaca que a orientação se aplica apenas para o cumprimento de decisões com trânsito em julgado, ou seja, que tiveram a tramitação encerrada no Judiciário. Para os demais, alerta uma fonte, continua valendo a regra que a Receita e PGFN consideram corretas, que inclui o ICMS na base de cálculo do PIS/Cofins.

Em nota, a PGFN afirma que os prejuízos com a pendência de julgamento “são grandes” pelo aumento da judicialização, incluindo o surgimento de novas teses. Para o órgão, há o trânsito em julgado prematuro em alguns casos, causando ausência de isonomia entre os contribuintes.

“Não é um julgamento que aconteceu há dois anos. É um julgamento que vem se arrastando há cerca de vinte anos. É muito desproporcional que a gente ainda esteja nessa indefinição”, afirma Tathiane Piscitelli, professora de direito tributário e finanças públicas da FGV/SP.

De acordo com ela, o impacto de R$ 250 bilhões, caso a União tenha que devolver os valores pagos pelos contribuintes desde o início da tese, é falso, já que a Receita Federal não consegue explicar a conta. A advogada já solicitou os dados por meio da Lei de Acesso à Informação, mas não obteve resposta. “A Fazenda bate nesta tecla para tentar minimizar seus danos com a modulação de efeitos”, diz.

Para a professora, a indefinição é grave. A possibilidade de o julgamento ser concluído, segundo ela, gerou uma corrida ao Judiciário no começo de 2017. Isso ocorreu porque o STF costuma limitar a devolução dos valores pagos nos últimos cinco anos para quem entrou com ação antes da decisão de mérito, acrescenta. “Mas não se sabe se isso vai acontecer. Inicialmente, a Fazenda Nacional pediu que a decisão só tivesse validade após o julgamento, mesmo para quem entrou com ações antes”, afirma.

A partir da decisão de mérito, de acordo com a advogada Glaucia Lauletta, sócia do escritório Mattos Filho, as empresas podem pedir a exclusão do ICMS por meio de liminar e já reduzirem a tributação. E mesmo que a União ainda possa recorrer, acrescenta, ela pode ser multada se a medida for considerada protelatória.

Por Beatriz Olivon, Fabio Graner e Joice Bacelo | De Brasília

Fonte: Valor Econômico

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